O Supremo Tribunal Federal (STF) pautou para a próxima sessão plenária do dia 23 de fevereiro o julgamento da ação que discute a validade de um acordo de cooperação internacional assinado entre o Brasil e os Estados Unidos para o compartilhamento de dados de usuários armazenados por empresas multinacionais de tecnologia. A discussão ocorre na ADC 51.
O julgamento começou em outubro do ano passado e, na ocasião, o ministro Alexandre de Moraes interrompeu a análise da matéria sob a justificativa de que havia paralisado outros julgamentos de temática similar. No dia 30 de janeiro de 2023, Moraes devolveu os autos para julgamento, e a presidente do STF, Rosa Weber, inseriu na pauta da próxima semana.
O resultado do julgamento pode gerar um eventual prejuízo para as investigações na obtenção de dados hospedados no exterior, como é o caso do inquérito das fake news, das milícias digitais e dos atos antidemocráticos.
Até a interrupção do julgamento por Moraes, o placar estava em 2 votos a 1 pelo não conhecimento da ação, ou seja, para que o Supremo nem discuta o mérito da questão. O relator, ministro Gilmar Mendes, votou pela constitucionalidade do acordo, porém, destacou que essa não deve ser a única forma de a Justiça brasileira obter informações sobre comunicações privadas em caso de investigação judicial. Assim, as autoridades brasileiras podem se valer de outros meios como a intimação direta das empresas no Brasil ou carta rogatória.
A divergência pelo não conhecimento da ação veio dos ministros André Mendonça e Nunes Marques. Eles entendem que a associação autora não tem legitimidade para ingressar com uma ação de controle concentrado; defendem ainda a falta de controvérsia jurídica relevante que justifique a análise da matéria pelo Supremo. Se vencidos em relação ao conhecimento, os dois ministros se manifestaram que vão acompanhar o relator no mérito.
A ADC 51 foi ajuizada pela Federação das Associações das Empresas de Tecnologia da Informação (Assespro Nacional), que pede ao Supremo que confirme a constitucionalidade do Decreto Executivo Federal 3.810/2001, que promulgou o Acordo de Assistência Judiciário-Penal entre o Brasil e os Estados Unidos (Mutual Legal Assistance Treaty – “MLAT”) e, assim, que ele seja o caminho utilizado pelas autoridades brasileiras para se conseguir informações sobre comunicações privadas de usuários.
De um lado, o Ministério Público defende que restringir o acesso dos dados de usuários hospedados no exterior via acordo bilateral pode impactar na velocidade das investigações e na própria soberania nacional, ao ter que submeter a outro país a decisão de repassar ou não informações importantes para as investigações brasileiras. Por outro lado, as empresas de tecnologia defendem que há risco à segurança dos dados dos clientes e pode haver descumprimentos da legislação do país sede da empresa, principalmente os Estados Unidos.
O pedido da Assespro vem após distintas decisões que tribunais e magistrados brasileiros têm dado para obter acesso a provas importantes para investigações criminais, muitas delas buscando caminhos alternativos ao MLAT, ou seja, intimando diretamente as empresas no Brasil, ou por carta rogatória, sem recorrer ao acordo. De acordo com o MLAT, as requisições de dados devem ser feitas entre o Ministério da Justiça do Brasil e o Departamento de Justiça dos Estados Unidos.
Autora: FLÁVIA MAIA – Repórter em Brasília. Cobre Judiciário, em especial o Supremo Tribunal Federal (STF). Foi repórter do jornal Correio Braziliense e assessora de comunicação da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Faz graduação em Direito no IDP. Email: [email protected]
Foto: Fachada do STF / Crédito: Fellipe Sampaio /SCO/STF